Simplificando a Tecnologia Blockchain

Blockchain

Hoje eu vou contar para vocês a minha primeira experiência com blockchain e peço que não me julguem. Em 2016, eu estive em Cannes participando de um dos primeiros eventos voltados para o mercado de eSports, que reuniu palestrantes de todas as partes do mundo. Entre eles um engenheiro da IBM especializado em blockchain.

Nós ficamos amigos e ele passou os cinco dias do evento tentando me explicar o que era blockchain e a valorização que o Bitcoin teria nos anos seguintes.

O meu Inglês não era muito bom na época e misturado à minha falta de conhecimento em tecnologia me esforcei, mas não consegui entender nada. Não entendi inclusive por que aquele profissional da IBM ia dar uma palestra em um evento de eSports.

O fato é que se eu tivesse entendido poderia ter aposentado no ano seguinte.

Vou explicar por que eu poderia ter enriquecido. Em 15 de julho de 2016, 1 Bitcoin (BTC) era cotado a US$ 665, segundo o Cointelegraph Markets. Em 15 de julho de 2020, o Bitcoin valia, em média, US$ 9,250. Ou seja, a moeda virtual alcançou uma valorização de 1.390% em quatro anos.

Para que vocês me absolvam, publico aqui a definição de blockchain do site da IBM: “blockchain é um livro-razão imutável e compartilhado que facilita o processo de registro de transações e de controle de ativos em uma rede de negócios”. Se ouvissem isso em um evento de eSports vocês entenderiam? Pior ainda seria entender essa definição em Inglês, certo?

Agora que contei a minha história vamos aos fatos. A primeira moeda digital (criptomoeda) lançada usando a tecnologia blockchain foi o Bitcoin. Como eu demonstrei aqui, ao longo dos anos mais pessoas passaram a entender o mercado de criptomoedas e a demanda aumentou tanto que o valor de um Bitcoin alcançou valorização de até 200.000.000%.

Para que vocês não comam bola como eu comi, resolvi que nesse site vamos explicar tudo nos mínimos detalhes.

O Que é Bitcoin

Símbolo do Bitcoin
Símbolo do Bitcoin — Foto: Reprodução/Pixabay/TheDigitalArtist

Antes de prosseguir defino aqui o que é Bitcoin. Trata-se da primeira moeda virtual. Como tal, ela é uma moeda descentralizada e livre, que não precisa da interferência de bancos. Podemos dizer que é um dinheiro eletrônico para transações financeiras ponto a ponto, que existe somente virtualmente – não tem como pegar nele, nem contar cédulas.

Os registros históricos contam que o Bitcoin apareceu pela primeira vez em um artigo de um grupo de programadores sob o pseudônimo Satoshi Nakamoto, em 31 de outubro de 2008. Em 2009, o Bitcoin foi usado pela primeira vez com Nakamoto extraindo o bloco original com os primeiros 50 BTCs, mas ele não conseguiu comprar nada com eles.

A primeira transação com Bitcoin foi registrada no ano seguinte quando um programador americano de Miami lançou um desafio na Internet. O objetivo era fazer a primeira compra com uma moeda digital. E ele conseguiu!

Em 22 de maio de 2010, Laszlo Hanyecz pagou 10.000 bitcoins por duas pizzas. Uma década mais tarde, em 2020, as 10.000 moedas estavam cotadas a US$ 600 milhões.

Com o passar dos anos, o Bitcoin teve uma valorização enorme, chegando a 200.000.000%, mas ainda ficava restrita aos profissionais de tecnologia.

Por causa dessa primeira transação, todo ano, em 22 de maio o mundo comemora o “Bitcoin Pizza Day”.

Quero fazer o registro aqui de uma tentativa frustrada que aconteceu antes do Bitcoin. Diz a história que em 1982, ou seja, 27 anos antes do white paper de Nakamoto, o universitário David Chaum, candidato a doutoramento da Universidade da Califórnia em Berkeley, descreveu uma base de dados de blockchain em sua dissertação.

Este estudo resultou na DigiCash, fundada por Chaum, em 1989. Anos depois, em 1995, ele lançava a criptomoeda DigiCash, que tinha muitas das características do Bitcoin. Mas seu negócio faliu logo depois.

Qual a Relação Entre Blockchain e Bitcoin?

A origem da blockchain está ligada à origem do Bitcoin. Blockchain é a tecnologia que está por trás dos Bitcoin e das demais moedas virtuais, também chamadas de criptomoedas ou moedas virtuais.
Blockchain é um banco de dados que contém o histórico de qualquer informação que ele foi projetado para armazenar. Por isso serve também para manter únicas as NFTs (tokens não fungíveis). Creio que todos se lembram das figurinhas virtuais dos macacos, que ficaram famosas. Elas eram NFTs.

De forma simplificada trata-se de uma tecnologia composta por uma cadeia de blocos – isso explica seu nome e as imagens que aparecem nos sites para ilustrar os artigos. Enquanto tecnologia, agrupa um conjunto de informações que são conectadas entre si por criptografia, daí vem a denominação criptomoeda.

Mas além de transações financeiras como o P2P cripto, negociação direta das moedas entre compradores e vendedores, a blockchain pode ser usada por empresas de e-commerce e plataformas tecnológicas para validar transações de forma segura.

A Definição da Amazon

Em seu site, a Amazon explica esse conceito bem melhor que a IBM. “A tecnologia blockchain é um mecanismo de banco de dados avançado, que permite o compartilhamento transparente de informações na rede de uma empresa. Um banco de dados blockchain armazena dados em blocos interligados em uma cadeia. Os dados são cronologicamente consistentes porque não é possível excluir nem modificar a cadeia sem o consenso da rede”.

Desta forma, é possível usar a tecnologia blockchain para criar um ledger inalterável ou imutável e assim fazer o monitoramento de várias transações, como pedidos e pagamentos, sendo ledger é o livro-razão citado pela IBM.

Nas transações com blockchain, um ledger ou livro-razão significam um sistema de manutenção de registros dos saldos dos diversos participantes e de todas as transações que ocorrem na rede.

Através de criptografia, o sistema blockchain oferece mecanismos integrados que o protegem das entradas de transações não autorizadas e permitem visualizar de forma consistente e compartilhada todas as transações feitas dentro dele. Assim, transações financeiras e outras operações podem ser feitas de forma segura.

A segurança é garantida uma vez que a blockchain verifica as transações. Os blocos armazenam detalhes e a identificação do processo de transferência dos ativos digitais, que em questão de segundos passam de um dono para outro. Nesse tipo de transação não é preciso usar um banco.

Os Bancos Estão Usando a Tecnologia

Mas nem por isso os bancos estão abrindo mão de usar a tecnologia blockchain. Os sistemas financeiros tradicionais, como os bancos ou a bolsas de valores, usam os serviços de blockchain para gerenciar pagamentos, contas e o mercado comercial online.

No Brasil, instituições financeiras como o Santander, Itaú e BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico) já a utilizam, como forma de reforçar a segurança em algumas transações.

A blockchain e as DeFi vão juntas como cerveja e pizza. As aplicações DeFi rastreiam transações seguras ao mesmo tempo que eliminam os intermediários lentos – como instituições financeiras.

O que é DeFi

DeFi é um conjunto de serviços e produtos financeiros. Entre eles temos empréstimos, transferências e sistemas de pagamentos, que rodam em uma blockchain.

As aplicações DeFi estão disponíveis para emprestar e pedir empréstimos, fazer transferências internacionais, investimentos e outras operações.

A Tecnologia Aplicada a Outros Mercados

A Saúde é uma das áreas que está sendo revolucionada com a utilização de blockchain. A arquitetura da base de dados blockchain favorece o armazenamento dos dados de registos de saúde pessoal. Para que os dados sejam acessados pelo paciente, o médico, a farmácia basta que conectem à Internet. Cada ponta do processo pode pesquisar e armazenar dados no mesmo local. Funciona como um google drive privado.

A tecnologia blockchain pode ser usada pelas empresas de seguro para diminuir fraudes e agilizar o reembolso dos sinistros.

Ela pode ainda ser aplicada no processo de votação nas eleições.

Uma das aplicações que mais gostei foi nos IPs -registros de propriedade intelectual. Há mais de 20 anos vejo os desenvolvedores de videogames preocupados com a pirataria. Acabar com a pirataria de músicas, filmes, videogames e obras de arte é fantástico.

A distribuição feita através da blockchain poderia tornar cada cópia de um ficheiro multimédia digital único e fornecer um mecanismo conveniente para os espetadores fazerem micro pagamentos diretamente aos criadores ou aos distribuidores.

A mesma lógica está sendo testado no Póker, jogos de azar e apostas online. A blockchain pode criar um registo que estabelece a aleatoriedade dos lançamentos dos dados, em todos os tipos de jogos que envolvem dinheiro. A blockchain pode registar os pontos fortes dos jogadores em jogos de RolePlay e os seus ganhos em jogos de azar.

Nos videogames, a blockchain pode ser usada na sua compra em lojas online, bem como nas personalizações e outras funcionalidades, criadas através de tokens não fungíveis.

Grandes companhias já estão usando essa tecnologia e criando suas próprias versões de metaverso.

Empresas que Utilizam Blockchain

Quase metade das empresas da lista Forbes Top 50 Blockchain não têm sede nos USA e 14% estão na China, onde a tecnologia é levada a sério.

Um ponto interessante levantado pela revista é a utilização em grande número de seguradoras e imobiliárias pelo mundo afora. O blockchain é usado para verificação de sinistros de seguros e na compra e venda de imóveis.

Esta tecnologia tornou-se ainda vital para as cadeias de suprimentos, seja atestando que produtos não vêm de zonas de conflito ou rastreando autopeças. Nesse caso a francesa Renault já a utiliza.

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Blockchain e Videogames

Juntando blockchain e Inteligência Artificial, do tão discutido Chat GPT. A Delisyum, publisher de games Web3, está trabalhando no beta teste da Lucy. Como o primeiro sistema operacional Web3 alimentado por IA, Lucy pode responder perguntas sobre o mundo criptográfico e ajudar o jogador a utilizar todos os tipos de produtos on-chain, sem permissão por meio de linguagem natural. Muito em breve, Lucy integrará os próximos 100 milhões de usuários no mundo criptográfico.

Blockchain pode ser usada em jogos, destacando a individualidade de cada jogador de uma forma que nunca se viu. Através dela, cada jogador pode obter itens ou avatares únicos e impossíveis de serem obtidos por qualquer outro jogador. O novo conteúdo é relevante nas vendas de DLC e microtransações, e esse novo elemento completamente exclusivo pode oferecer aos jogadores um item ou avatar verdadeiramente raro que tem seu próprio valor.

O primeiro jogo digital blockchain popular de que se ouviu falar foi Cryptokitties. Nele, os jogadores podem adotar, criar e trocar gatos virtuais com características únicas.

CryptoKitties da Dapper Labs
CryptoKitties, da Dapper Labs — Foto: Divulgação/Crypto Kitties

O jogo roda na blockchain Ethereum e contratos inteligentes são formados toda vez que um gato é adotado, criado ou negociado. Um token também é emitido para o usuário. Essa NFT dá ao jogador propriedade total sobre um gato virtual. O objetivo do jogo é procriar os gatos para vende-los. Alguns gatos foram vendidos por mais de US$ 100.000 por causa da raridade de suas características.

O sucesso do Cryptokitties em 2017, levou várias empresas chinesas a estudarem a tecnologia para ver como poderiam desenvolver seus próprios jogos de blockchain de sucesso.

Além das gigantes dos jogos como Tencent e NetEase, conglomerados de Tecnologia e Internet, entre eles Baidu e Xiaomi lançaram seus próprios jogos de blockchain.

“Laici Dog”, primeiro jogo da Baidu, chegou ao mercado chinês em fevereiro de 2018 e foi desenvolvido por sua equipe interna de blockchain. O jogo é semelhante ao Cryptokitties, com cãezinhos, e sem transações em dinheiro. As moedas são trocadas por produtos Baidu. A Xiaomi preferiu animaizinhos mais cativantes e lançou “Crypto Rabbits”.

A NetEase, uma grande publisher de PC e mobile games anunciou Lucky Cat, seu primeiro jogo de blockchain, em 2018. Lucky Cat visava capitalizar o sucesso dos Cryptokitties. No entanto, o jogo foi encerrado após apenas alguns dias de teste e os usuários foram reembolsados. Mas a empresa continua tentando e recentemente anunciou que está trabalhando em um game que pode vir a ser o primeiro triple A da Web3.

Por último, mas não menos importante, a Tencent, maior empresa de jogos do mundo, em 2019 lançou seu primeiro jogo blockchain em plataformas mobile iOS e Android. Let’s Hunt Monsters combina tecnologia blockchain, realidade aumentada (AR) e serviços baseados em localização (LBS), a mesma de Pokémon GO.

Let's Hunt Monsters, da Tencent
Let’s Hunt Monsters, da Tencent — Foto: Divulgação/Let’s Hunt Monsters

Apesar de ter ficado restrito à China, Let’s Hunt Monsters da Tencent, um lançamento apenas na China, foi um sucesso e no ano de lançamento ultrapassou US$ 50 milhões em gastos de jogadores no iOS, de acordo com estimativas da Sensor Tower Store Intelligence.

Total gasto em jogos baseados em geolocalização
Total gasto em jogos baseados em geolocalização — Foto: Reprodução/SensorTower

O estudo revelou outro fato interessante. Ao contrário de outros jogos de blockchain, Let’s Hunt Monsters não se baseia em nenhuma propriedade intelectual pré-existente, mas isso não impediu que os gamers de iOS chineses gastassem mais que o dobro no título de blockchain do que gastaram em Jurassic World Alive, que não usa esta tecnologia.

Fernanda Domingues

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